quinta-feira, 7 de março de 2013

reflexão crítica sobre 7 conferências #05


Estética do Engenheiro, Arquitectura 

Texto crítico as partir da conferência de Pedro Horta, Dr. 11 de Abril de 2012 



“Estética do Engenheiro, Arquitectura, duas coisas coesas, consequentes, a primeira a florescer, a outra em penoso regredir.”11


As reflexões tecidas sobre o tema da Engenharia e Arquitectura, entre 1921 e 1922 pelo Charles-Edouard Jeanneret-Gris, no seu livro “Vers une Architecture”, parecem ainda actuais, continuando-nos a alertar sobre um problema premente de desconexão disciplinar, cuja resolução poderá permitir que o acto de projectar venha a ser realmente um serviço público. Arquitectura, etimologicamente falando, pode ser interpretada como “arte de construir”, conseguindo alcançar o estatuto de “arte de representar a sociedade”12. Noventa anos após edição do Livro do Le Corbusier, esta ruptura generalizada entre disciplinas continua evidente, marcada por uma ausência de objectivos comuns, por uma falta de leitura holística dos problemas e da realidade. Só ocasionalmente encontramos projectos, neste caso de arquitectura, que carregam um conhecimento mais extenso, mais preocupado em dar resposta a múltiplas questões multi-disciplinares, através da construção de um espaço. Se hoje, de forma mais genérica, os profissionais da construção de “lugares” já assimilaram a necessidade da relação estrita entre as disciplinas da Engenharia civil e Arquitectura, estamos ainda muito longe de podermos olhar a curto prazo para um trabalho pluri-disciplinar, empenhado económico-socialmente na procura de respostas às perguntas que um projecto nos coloca: Qual o papel da Arquitectura no projecto “global?”.
A Engenharia ligada à energia está, hoje, em pleno florescimento, pois está apoiada por um mercado “eticamente correcto”, que ao carregar o fardo de salvador da humanidade, menos acusa a recessão. De facto, movida estrategicamente pela Economia Global, tem vindo a construir estratégias de implementação no território, de forma autónoma e as vezes autista. Na realidade, pouco importa imputar responsabilidades sobre este isolamento que reforça o vazio de conteúdos da “arquitectura” (ou edificação genérica). Hoje, interessa começar a entender a necessidade de aceitar esta obrigação e até de re-pensar em grande escala sobre o seu ensino. Parece na realidade possível aplicarmos a leitura do Nikos A. Salingaros sobre arquitectura e o paralelismo evidente na definição de arquitectura como “Anti-Vitruviana”.13
Os três pilares milenares da arquitectura (utilitas, firmitas, vetustas) parecem não conseguir estar presentes unitariamente nos projectos e muito menos nos edifícios construídos.
Tendo em conta que a Arquitectura define-se etimologicamente como “arte de construir” (arte de construir o habitat humano, começa na construção do lar, em que o fogo é a sua energia propulsora) poderemos constatar o conhecimento superficial que os profissionais têm sobre as actuais estratégias energéticas. Entre sistemas passivos, que outrora eram bases de reflexão e re-invenção de uma arquitectura erudita, e os sistemas activos, que a tecnologia actual nos proporciona, temos muita informação para reinventar a nossa profissão. Re-apropriar-mo-nos destes conhecimentos sem ter receio de quanto estes poderão afectar o resultado, será talvez a única forma de re-qualificar uma profissão “arbitrária”

A capacidade de regeneração da arquitectura através da sua leitura crítica no âmbito humanísticos e a natural facilidade de apropriação das novas tecnologias, ambas para melhor transformar e construir o espaço, é o engenho desta disciplina. Uma Arquitectura integrada, resultado também de um trabalho científico, pluri-disciplinar. Julgo ser este o caminho.
  1. 10  LE CORBUSIER, Verso una Architettura, ed Longanesi & C, Milano, 1984. Trad. Pierluigi Cerri e Pierluigi Nicolin. Trad. Livre para Português
  2. 11  Ibidem 1
  3. 12  PIANO Renzo, conferência

13  SALAMA, Ashraf M., A new Vitruvius for 21st – Architecture and Urbanism? Archnet-IJAR, International Journal of Architectural Research – Volume 1, Issue 2 , 2007, p. 118



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quarta-feira, 6 de março de 2013

Terça feira de projecto

É um período relativamente cinzento (e estou a ser optimista :). Estamos todos atentos ao que se está a passar economicamente e socialmente... e não é novidade! está no ar!
A minha profissão têm sofrido bastante com esta recessão cultural. Não é em tom de queixa que escrevo estas poucas linhas...  não me interessa, nesta sede, encontrar responsáveis (pois acho que todos somos... quem mais, quem menos), mas sim partilhar a felicidade que provei em fazer um pequeno projecto. Era já tempo que não projectava, era já tempo que não tocava com as mãos numa maqueta, era já tempo que não trabalhava em equipa a procura de uma solução para um problema.... quase dois anos! 
Todos sabemos que uma vez aprendido a  ir de bicicleta, nunca se esqueçe... mas para quem passou uma boa fatia da vida a fazer disto uma profissão, uma vida... a total ausência de trabalho deixou uma preocupação, legítima. 
Trabalhei (e estou a trabalhar) com um caro amigo, num formato simples (como o projecto o é) e cadenciado. Foi uma joia! e voltei a sentir que é mesmo isto que quero voltar a fazer... 
Não será cá, pois... mas será onde é mais necessário, onde é preciso.
Um projecto de vida em fase de licenciamento! complexo neste caso, mas que tentarei resolver com todo o meu amor... e alguma sabedoria!


terça-feira, 5 de março de 2013

reflexão crítica sobre 7 conferências #04


“que futuro?.”
Texto crítico as partir da conferência de João Ferrão, Dr. 21 de Março de 2012
    
“An ecosystem is a community of species that interact with one another and with their physical surroundings. In ecosystems, energy transfers from species to species in the form of food or prey, and this energy transfer works best when the ecosystem’s members are all present and healthy. Ecosystems can be difficult to recognize at times because they range from very small systems to huge systems..”9

O desenvolvimento das redes de comunicações é definitivamente um passo determinante na evolução, não só tecnológica como, também, social. Um sistema que permite comunicação livre, ou quase, num mundo “paralelo” em que a sociedade se organiza, aprende, compra, estabelece relações, vive, sem ter que resolver o obstáculo do espaço físico. A sua “Arquitectura” virtual, simplesmente permite intercâmbios, sem barreiras, adaptando-se ao utilizador. No entanto, numa escala Nacional, real, em que o território tem uma subdivisão política consolidada, fruto do nosso crescimento (às vezes sábio e atento mas quase sempre aleatório, distraído e egocêntrico), as relações encontram na cidade, em que o corpo é o nosso mediador, grandes dificuldades. O habitat humano (o construído) é menos apto a grandes correcções, pois a edificação de lugares é um acto que comporta um enorme gasto de energia. Mas entre a proclamada desertificação do “interior” e a resultante concentração populacional em zonas urbanas, senti-mo-nos (no papel de utilizadores) impotentes perante o fracasso do “urbanismo” que, por falta de visão ou competência, não consegue operar uma eficaz ordenação do espaço.
Mas será que existirão critérios científicos que nos permitam orientar uma (re)construção do “habitat humano”?
Na prática, esta é claramente uma questão ligada a uma parca visão do futuro colectivo, operada pela figura do político, fraco mediador entre quem o escolheu e os interesses económicos. No entanto, assumindo uma postura imaginária em que é o interesse público que gere o território, numa sociedade provavelmente utópica, esta pergunta assumiria alguma relevância. Será que poderemos através dos dados existentes consultar o oráculo e perceber onde investir o nosso esforço? Na verdade, muitos dados estatísticos são públicos (partilhados no nosso habitat virtual) e demonstram uma realidade feita de números que respondem a perguntas muito específicas, conseguindo ao mesmo tempo desenvolver uma hipótese de tendências. Para exemplificar, Portugal mostra no relatório de 2011 das Nações Unidas, sobre desenvolvimento populacional, uma concentração de 61% em áreas urbanas contra 39% em áreas rurais, sendo que só 6% da população está ligada à actividade económica da Agricultura. Espera-se, além disto, uma percentagem de 82% de concentração urbana até 2025, tal como uma diminuição demográfica até 7,3 milhões de habitantes, dos 10 milhões que somos actualmente. Parecem dados interessantes, que quando cruzados com outros, por exemplo os relativos à idade populacional e sua distribuição territorial, nos proporcionam indícios de movimentos humanos no território. De facto, o homem concentra-se em torno de áreas cuja economia, na qual pretende participar, lhe garanta o sustento físico, intelectual e vivencial. Poder-se-ia, talvez, através de um algoritmo criado a volta dos movimentos humanos, económicos, sociais e políticos, definir direcções estratégicas. No entanto, o factor humano, ou como o Prof. Jorge Gaspar o chamou, o “saber”, é uma variável importante na alteração do equilíbrio das forças. As economias possíveis e necessárias são no entanto distribuídas sobre um território, que não conseguiu ainda construir uma rede tão eficiente, como a rede virtual. O espaço, organizado através de uma Lei dos solos obsoleta, é uma barreira difícil de transpor para garantir uma sustentável utilização eficiente dos recursos, naturais ou artificiais. Existem reflexões, estudos, planos, falta provavelmente a vontade de abraçar uma política de interesse publico, responsabilidade, também, de uma população ainda longe de conseguir, através do conhecimento, tomar as rédeas do seu destino.


9 MACZULAK, Anne, Sustainability, building Eco-friendly Comunities, ph.d,2010 




segunda-feira, 4 de março de 2013

reflexão crítica sobre 7 conferências #03


entre Romantismo e Ciência
Texto crítico as partir das conferências dos: Dr. Jorge Gaspar, Prof. Mário de Carvalho e Eng. Alfredo Cunhal Sendim. 14 de Março de 2012




Escreve Gonçalo Ribeiro Telles no seu texto “Paisagem Global” que: “A invenção da paisagem é uma consequência da apropriação, pela sociedade humana, do espaço físico necessário à actividade agrícola ou à pastorícia”, reportando a questão da alimentação como primeira necessidade. A Agricultura está, em consequência, no topo da pirâmide hierárquica, pelo menos até encontrarmos novas, se desejadas, formas de alimentar o corpo. No entanto, é historicamente comprovado que a terra e o clima, nesta área geo-política, foi sempre difícil de domesticar e que o conceito da produção alimentar nacional portuguesa na economia europeia nunca foi uma prioridade. Assim, a composição geológica, conjuntamente com uma metodologia desadequada de cultivo, face as variáveis climáticas, topográficas e até políticas, torna a produção de alimentos pouco sustentável a grande escala. Contudo, o encarecimento substancial do petróleo, que levou entre outras a re-proporcionar a distribuição de alimentos a nível planetário, lançou um novo olhar sobre uma profissão desincentivada: a agricultura. A agricultura que ainda hoje é dependente de financiamentos públicos para o seu desenvolvimento, tem-se tornado um tema de discussão. Talvez uma nova oportunidade económica a explorar... Em tempos, os recursos naturais foram o princípio do estabelecimento de uma comunidade num lugar e, hoje, a sua sustentabilidade económica continua a ser conditio sine qua non para a sua continuidade. Parece, assim, incontornável a necessidade de proximidade entre o consumidor e o bem de consumo. Os dados publicados pelas Nações Unidas sobre crescimento populacional estão disponíveis, tal como as projecções sobre concentração territorial de habitantes. Ainda assim, mesmo perante as percentagens, continuamos a precisar de re-integrar na nossa economia a agricultura e a pastorícia. Talvez alguma nova prática de cultivo urbano em hortas possa aliviar a necessidade deste bem primário, mas não fará frente, certamente, à necessidade Nacional ou de aglomerados urbanos densamente habitados, como estatisticamente projectados7. Agricultura como ciência da produção alimentar, para garantir um equilibrado processo de desenvolvimento sustentável, ou como pretexto para a criação de comunidades/cidade-estado em nome de uma economia local?
Os dados transmitidos pelo Dr. Mário de Carvalho na sua investigação parecem irrefutáveis: a terra é pobre; o sistema tradicional da aragem é prejudicial ao terreno, pois facilita o escorrimento das águas e a produção é constantemente posta em perigo pela actuação da natureza. Já entendemos a necessidade de respeitar o eco-sistema para tirar o máximo proveito da terra. Conhecer e introduzir novas técnicas de cultivo, em grande escala, parece-me interessante e ao serviço do interesse público, re-descobrindo relações homem-natureza através das ciências. Os exemplos apresentados, de parcelas contíguas cultivadas durante períodos longos com técnicas diferentes à procura de soluções mais eficientes, mostram a capacidade de melhoria através do “conhecimento”8 Mas o homem é, também, tendencialmente sonhador e romântico, conseguindo encontrar novas possibilidades e oportunidades na necessidade e no descontentamento geral. A Agricultura biológica é claramente próxima de uma visão da procura do paraíso, do Éden. Alimento produzido através do cultivo de “gente”, num processo utilizado tradicionalmente ao longo de séculos que, embora seja comprovado não ser muito eficiente, leva-nos a um tempo memorial, repleto de imaginários colectivos, tanto agradáveis como às vezes fictícios. De facto, é inegável o fascínio e algum romantismo que sentimos pensando numa quinta com o seu lado áspero e duro e o outro poético e inspirador. Comunidades estão a crescer a volta deste conceito, não só à procura de uma nova economia, mas também de uma diferente forma de viver. Parece-me, contudo, haver espaço para ambas as possibilidades: necessidade colectiva e procuras individuais. Estas duas posições, aparentemente contraditórias, são ambas movidas pela vontade de tornar a paisagem num elemento vivo e produtivo, pelo respeito do equilíbrio ecológico: uma culta; outra romântica.
  1. 7  Texto crítico 3 “que futuro?”
    8  Telles, Gonçalo Ribeiro. Artigo paisagem rural 


by nadir bonaccorso



Os perigos da Montanha

Estávamos pacatamente discursando, ao jantar de quinta feira passada, sobre curiosidades. Sebastião, afilhado adquirido através de uma maravilhosa fatalidade, contava das grandes habilidades dos Sherpas Tibetanos, capazes de feitos únicos, naquelas montanhas do Tibete que nos parecem distantes e extremamente insidiosas tal como pouco aptas ao habitat humano. Sherpas capazes de escalar irtas paredes rochosas para colocar as cordas para os aventureiros ocidentais que optaram desafiar a natureza em condições extremas... Entre uma garfada e outra, lembrando-me do livro do Neil Leich (a anestética da arquitectura) lancei uma reflexão: Será que um Sherpa, tão hábil e atento no reino da natureza ainda selvagem, sobreviveria a um dia na cidade? As imagens que surgiram a seguir foram mais uma oportunidade de risota (que normalmente não falta por aqui). No sábado, um acontecimento inesperado, que lamentavelmente e involuntariamente testemunhei, trouxe de volta aquela que foi a anedota da noite de quinta. Estava na rua, a pé em direcção ao carro, quando oiço ao longe duas mulheres ofegantes, falar alto ao correr para apanhar o autocarro. Mãe e filha, carregadas do próprio peso e de sacos das compras, ansiavam não perder aquele que talvez fosse o único meio de transporte para casa. Parei, encostei-me e virei-me para as deixar passar. A Filha (como descobrí a seguir) estava a frente e parou ao meu lado para atravessar a estrada. o autocarro (cujo número não memorizei) estava a parar do lado oposto da estrada... estava quase garantida uma chegada a casa cedinho. Mas onde estava a Mãe? Com  uma agilidade inusitada por uma mulher tão pesada e carregada de compras, tinha passado por entre carros estacionados e atravessado, sem olhar, a estrada, embatendo num taxi que procedia devagar naquela que é chamada "a procura de um cliente". Foi um segundo. Uma desatenção. Um pé na ravina.
As cidades também as têm. E são, algumas delas, tão pouco adequadas e "humanas", na sua aleatória construção e organização que podem rivalizar com o Everest, em graus diferentes. 
Faltou o Sherpa urbano mas chegou o inem.  
A dita do agente da PSP, que uma hora depois veio medir a rua, a Senhora estava em condições normais, com uma pequena contusão... Esta ravina não foi tão profunda (e ainda bem.... :). 
São também estes momentos pesados que nos obrigam a pensar, sentir e valorizar cada segundo... e desejar podermos sempre estar a altura dos Sherpas Tibetanos, nestas cidades que precisam urgentemente de adaptar-se melhor ao homem contemporâneo. mas esta é outra história. 
Fica aqui esta nota sobre um facto, comum numa cidade como Lisboa.

sexta-feira, 1 de março de 2013

reflexão crítica sobre 7 conferências #02



A procura do Paraíso
Texto crítico as partir da conferência de Gonçalo Ribeiro Telles, arquitecto paisagista. 15 de Fevereiro de 2012    


Entender o território na sua amplitude, através do seu ciclo, do seu eco-sistema natural, dos seus recursos, conseguindo assim e através deste “conhecimento do meio”, transformá-lo em habitat humano, é talvez a mensagem mais recorrente nas apresentações públicas do arquitecto paisagista Gonçalo Ribeiro Telles. Os desafios que o século XX lançou e a transformação que operou, não só no território mas também na sociedade e na “cultura” mundial, raramente espanta pela sua sensibilidade, traduzindo-se na grande maiorias dos casos em patologias planetárias. Exemplos não faltam para suportar esta preocupação, desde a criação de guetos desordenados e não infra-estruturados em terrenos inundáveis ou não apropriados para a construção, para os párias da sociedade, até ao contínuo florescimento de empreendimentos turísticos em plena paisagem natural, para a classe mais abastada. Patologias epidérmicas e internas, como se estivéssemos a falar de um corpo, vivo. Surge, assim, uma pergunta: quem somos e que procuramos?

Uma leitura provocatória sobre a natureza humana, talvez simplista mas carregada de razões, encontra-se no famoso monólogo do filme “Matrix”, dos irmãos Cohen, entre o Agente Smith e Morpheus:
“I'd like to share a revelation that I've had during my time here. It came to me when I tried to classify your species and I realized that you're not actually mammals. Every mammal on this planet instinctively develops a natural equilibrium with the surrounding environment but you humans do not. You move to an area and you multiply and multiply until every natural resource is consumed and the only way you can survive is to spread to another area. There is another organism on this planet that follows the same pattern. Do you know what it is? A virus.“

No entanto, sem querer banalizar esta reflexão, o esforço da nossa “civilização” na procura de uma resposta que nos direccione para o futuro, mesmo que aleatória, é real. Estamos num “work in progress”, que parece seguir (ou deveria) a metodologia Galileiana da experimentação. Contudo, nesta longa experiência, que opera as transformações no território, parece que a pergunta original se perdeu. Os resultados não são satisfatórios, pois estão a colocar em risco o nosso eco- sistema, deixando assim uma herança incómoda às futuras gerações. Continuamos na exploração desenfreada dos recursos, na procura de objectivos a curto prazo, e hoje (num momento de crise sócio-político-económica) torna-se indispensável esta reflexão, pois as marcas de um desenvolvimento esquizofrénico, auto-centrado,de cariz “antropófago” tornar-se-ão indeléveis . É evidente a necessidade de começar a reparar os erros do passado, em que o crescimento das cidades foi orientado pelo princípio da especulação económica, em prol de uma leitura não só social, mas sim de reconhecimento ancestral da força da natureza. Mas qual será pergunta capaz de mover a sociedade, qual a hipótese que permitirá a construção de um novo teorema.
Parece clara a visão do arquitecto paisagista que, com grande paixão, expõe-se e assume um papel de mensageiro de um conceito ancestral que o nosso espírito Humano não consegue ainda assumir e celebrar.
Reajustar os objectivos e, com responsabilidade, construir o “paraíso” do homem, é a questão que Gonçalo Ribeiro Telles nos sugere como desafio. E através do conhecimento, diria quase sabedoria, continuar a transformar e adaptar o território às nossas necessidades, conscientes de que, sem o respeito pelo delicado sistema em que vivemos, não a nível local mas sim planetário, o paraíso dificilmente estará ao nosso alcance.

Um alerta real e preocupado que, perante o trabalho que impõe para a sua resolução, complementava com uma frase de Samuel Beckett:
“Ever tried. Ever Failed. Try again. Fail better.
1


1 BECKETT, Samuel Barclay, Nohow On: Company, Ill Seen Ill Said, Worstward Ho: Three Novels, Grove press, 1983 





quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

reflexão crítica sobre 7 conferências #01


Sul concetto di arbitrarietá in architettura.1” 
Texto crítico as partir da conferência de Eduardo Souto Moura, arquitecto,  na abertura do curso de Doutoramento da Universidade de Évora., 6 de Fevereiro de 2012



Cosa sia l'Architettura, e come debbono essere istruiti gli Architetti.”2

O “de architettura” do Vitrúvio foi Doutrina por séculos, enquadrando de forma rigorosa e quanto mais científica possível a Disciplina, até a subversão de todos os sistemas político-económico-pedagógico-social, começada no final do século XIX com a Revolução Industrial e que lançou, em todas as áreas disciplinares, novos desafios que na arquitectura traduziram-se, também, numa necessidade de re-equacionar e enquadrar o habitat humano nos novos valores.
Esta mudança de paradigma obrigou a re-pensar na forma de construir e de fazer projecto em arquitectura. Ao longo do século XX, a constante procura de um modo de “fazer” ofereceu-nos (e ainda nos oferece) visões sublimes, “Espaço que é para nós a expressão das nossas possibilidades colectivas: a simbolizar o poder do homem, sendo ao mesmo tempo o sinal e o instrumento de uma capacidade infinita”3, obras singulares que ainda hoje propõem leituras sobre possibilidades e trilhos para a nossa cultura, reflexo da construção e interpretação dos seus lugares.
Na prossecução destes objectivos, destas visões, a arquitectura desenvolveu-se em paralelo com a evolução da cultura e da sociedade, num processo de influências recíprocas, desejavelmente numa procura de equilíbrios entre algumas contradições da “Democracia” que presenciamos hoje. Contudo, ao querer encontrar validação do real alcance destes preceitos através, por exemplo, de uma leitura sobre a construção do Território Humano, percebemos que são raros os casos exemplares a citar e que a arquitectura, hoje objectualizada e auto-referenciada, é genericamente autista face a uma leitura holística das necessidades, tal como é isenta de “visões” da Sociedade e do seu Espaço, salvo poucas excepções.
È neste pressuposto, aqui muito resumido e que mereceria maior desenvolvimento, que assentam as reflexões, outrora doutrina, hoje ainda actuais sobre: O que é a arquitectura e como devem ser instruídos os arquitectos?

A conferência proferida por Eduardo Souto Moura, Prémio Pritzker 2011, é um pretexto e uma oportunidade para uma reflexão.
“Queria não projectar nada, não construir nada que não trouxesse consigo a mensagem forte e clara de uma responsabilidade que não é unicamente estética, mas que também é de tipo ético e moral”4 responde Renzo Piano ao jornalista Renzo Cassigoli, externando uma leitura pessoal sobre a responsabilidade do arquitecto.
Talvez fosse uma única frase desta intensidade e deste comprometimento que gostaria(mos) e precisaria(mos) de ter ouvido também. Algum apelo que conseguisse despertar a consciência sobre o tempo que vivemos, lançando ao mesmo tempo um alerta, partilhando algum peso da responsabilidade que deveríamos sentir na nossa profissão, como arquitectos e cidadãos.
Mas na euforia e descontracção de um momento, que pode ser encarado de auto-celebração, o teor dos conteúdos transmitidos foi outro. Foi celebrado o projecto de interesse político e a capacidade de vendê-lo aproveitando a oportunidade. Foi celebrada a casa e o sentimento de “inveja” sobre o qual se gerou outro contrato. Foi celebrado o objecto arquitectónico num “não lugar”, construindo um espaço para um estilo de vida em vez que para o Homem. Ainda, com a leveza de quem parece não ter responsabilidade alguma com a construção de uma ética arquitectónica, foi afirmada a possibilidade de “o belo não ter que ser verdadeiro” mas poder ser atingido através de “maquilhagem”. Dulcis in fundo, foi comunicado o desencanto sobre o tema do habitar, objecto ancestral da construção do espaço humano, com a afirmação de que a “re-invenção da tipologia de uma casa não é fácil, quanto mais possível”. As palavras foram acompanhadas por imagens e desenhos que complementaram o conteúdo da comunicação mostrando entre outras: casas cuja orientação escolhida não respondem as exigências e preocupações actuais; muros cujos esforços para atingir a estética não justificam alguma pobreza de conteúdos; chaminés que servem só para o imaginário colectivos; edifícios de habitação colectiva que dissociando-se do espaço público proclamam a superioridade dos seus proprietários e a supremacia da tecnologia.



Talvez a conferência quisesse exactamente centrar o seu conteúdo neste declínio de valores humanos, a que também assistimos diariamente e ao qual parecemos imunes ou resistentes. Talvez quisesse alertar para o seu reflexo na arquitectura actual, criando assim uma oportunidade de debate a partir deste grande número de provocações.
O debate que se seguiu, entre outras, lançou uma questão sobre o papel interventivo do arquitecto com o objectivo de enquadrar, a partir da conferência proferida, quais as nossas responsabilidades hoje e se o nosso papel não deveria explorar, na descodificação de um lugar (de uma sociedade), todas as áreas de nossa competência e responsabilidade. A resposta dada, remeteu a um artigo do arquitecto Rafael Moneo, “sobre o conceito de arbitrariedade na arquitectura”, na revista Casabella, escrito há mais de 20 anos e que o grande público, eu incluído, desconhecia.
“Edificar significa hoje intervir no ambiente, na paisagem em que vivemos muito mais que construir um palácio.... A arquitectura dilui-se no ambiente: o arquitecto é incapaz de isolar um edifício. E se tal acontecer, já não faz sentido discutir sobre a arbitrariedade formal como origem da arquitectura.”, conclui Rafael Moneo no seu texto que explora a questão da arbitrariedade na construção da forma perante a função, respondendo à pergunta, mas deixando ainda mais em aberto a inquietude que a apresentação me proporcionou.



1 MONEO, Rafael, Casabella nº 189
2 POLLIONE, Marco VITRUVIO,Dell'Architettura, Libro Primo, trad. Carlo Amati, ed. Milano,1829
3 LEDRUT, Raymond , L'Homme et l'Espace em Encyclopédie de la Pléiade – Histoire des Moeurs, Paris, Gallimard1990
4 PIANO, Renzo, La responsabilitá dell'architetto, 2004, Passigli Editori, trad. Livre de “Vorrei non progettare nulla, non costruire nullache non porti com sé il messaggio forte e chiaro di una responsabilitá che non è solo estetica ma che è anche di tipo etico e morale.”